“Deixa
que os mortos enterrem os seus mortos;” (Lc 9,60).
Constantemente experimentamos estas
forças contrárias dentro de nós: vida e morte; luz e trevas; esperança e
desespero; alegria e tristeza. Temos sempre diante de nós dois caminhos (cf. Sl
1), e a cada dia, até mesmo a cada momento precisamos escolher. Em que consiste
esta luta? No discernimento e sabedoria que nos faz escolher a vida, a luz, a
esperança, a alegria. Discernimento e sabedoria que são dons do Espírito Santo.
Vida e morte. Recebemos o dom da vida
como um presente de Deus – a vida vem de Deus e está em nós, mas não nos
pertence. Junto com a força vital que recebemos quando fomos concebidos pode
ter vindo a força da morte se, por exemplo, fomos gerados, nascemos e vivemos
nossos primeiros anos de vida num tempo em que houve mortes na família. Esta
força da morte pode ser a raiz da tendência à melancolia, tristeza e depressão
presente em nós.
Luz e trevas. Em outros casos quando
fomos gerados nossos pais podem ter colocado uma expectativa exagerada sobre
nós. Expectativas do tipo: “esta filha, este filho, será minha alegria e
consolo; virá para preencher minha solidão e o vazio do meu coração, etc”. Se
houve antes um aborto esta expectativa tem ainda mais força, pois a criança
concebida carrega muitas vezes a responsabilidade de viver a vida da irmã ou
irmão que morreu. A força das trevas podem se cristalizar em nós e se
manifestar como autossuficiência, orgulho, perfeccionismo, obsessão, etc. Esta
situação impede a vivencia plena do senhorio de Jesus, pois só deixo a luz do
Senhor iluminar a superfície, mas o meu ser profundo é como um iceberg com sua
maior parte na escuridão, onde eu reino, onde não permito que a luz do Senhor
entre e me converta.
Esperança e desespero. A esperança vem
do amor de Deus: “E a esperança não
engana, pois o amor de Deus se derramou em nossos corações pelo Espírito Santo,
que nos foi dado” (Rm 5,5). Mas quando vivemos ligados à tudo de mal que
acontece no mundo, as vãs preocupações podem nos levar ao desespero. Isto é uma
ilusão, pois não podemos dar conta de tudo o que acontece no mundo! O desespero
não nos deixa ver a bondade e o amor presente nas pessoas e no mundo. Temos
esperança porque o Senhor está no meio de nós, caminha conosco, mesmo se, como
aconteceu com os discípulos de Emaús, não o reconhecemos na maior parte do
caminho.
Alegria e tristeza. A alegria é fruto do
Espírito Santo. Sua fonte é como uma nascente de água que brota do solo
ressequido do nosso coração, na aridez da nossa vida. Às vezes não nos damos
conta de como a tristeza nos faz mal – se a ela nos entregamos se torna um
câncer em nossa alma. Na tradição monástica antiga a tristeza é vista como o
oitavo pecado capital. Vejamos o que nos diz o livro do Eclesiástico: “Não entregues tua vida à tristeza nem te
atormentes com tuas reflexões. A alegria do coração é a vida da pessoa, e o
contentamento lhe multiplica os dias. Distrai-te, consola teu coração: expulsa
a tristeza para longe de ti. Pois a tristeza já causou a perdição de muitos e
não traz proveito algum” (Eclo 30,21-23).
Deixar
que os mortos enterrem os seus mortos... Ás vezes somos teimosos e nos
agarramos a pessoas, coisas e situações de morte ou que estão mortas para nós.
O que passou, passou. O mal e o bem que nos fizeram, que nos aconteceu e que
nós fizemos ou deixamos de fazer, não volta mais. Está na misericórdia de Deus.
Entregue com toda confiança a sua vida nas mãos amorosas do Pai, pois Ele cuida
de nós. Mesmo se você foi gerado em tempo de morte, rejeitado, maltratado,
abandonado... você sobreviveu. Sobreviveu porque o Senhor cuidou de você e
providenciou o necessário para sua vida. Vamos à Ele com cantos de alegria e
gratidão pelo maravilhoso dom da vida.
Senhor, nosso Deus e Pai.
Colocamo-nos na tua
presença, entramos no teu santuário com humildade e gratidão. Gratidão pelo dom
da vida, e alegria, pois o Senhor cuidou de nós. A ferida aberta em meu coração
pelos sofrimentos da vida foi curada pela chaga aberta no Coração de Jesus,
nosso Redentor. Pai, em teu amor, pelo sangue de Jesus, Cordeiro
imolado, eu perdoo a todos os que me feriram. E hoje mais uma vez eu me abro
para receber o seu amor e a vida que vem pela força do Espírito Santo.
Obrigada, Senhor, pela vida. Amém.